Passava todos os dias pelo mesmo lugar. Uma rua tranqüila, sem muitos carros, alguns becos escuros entre uma rua e outra. O comércio era silencioso, um barzinho ali e uma padaria acolá.
E, todos os dias, via uma garota. Estranha, ela sempre estava sozinha, enquanto eu sempre passava por lá com alguém, pois não era um lugar confiável. Às vezes com meu irmão mais velho, outra vez com um amigo. E ela nunca estava acompanhada.
O caminho era para a minha escola. Todos os dias, no mesmo horário, eu me encontrava com a tal garota. Eu e meus amigos vivíamos comentando sobre ela. Ela não ia para a escola, ela apenas se perdia na escuridão de um dos becos.
Sempre quis saber o que se passava em sua mente, pois era um mistério para todos nós. Achamos que ela era traficante, ou talvez uma garota de rua, mas era ajeitadinha demais para isso.
Um dia, como todos os outros, estávamos indo para escola. Eu e meu amigo. E, como de costume, ela estava subindo a rua. Estávamos andando lado a lado e ninguém dizia nada, só observando a garota esquisita do nosso lado. A rua era longa e foi um momento constrangedor, ela não andava perto da gente. Uma vez e outra, ela olhava discretamente para a gente, mas nossos olhos não desviavam de seu rosto. Enfim ela entrou no beco e desapareceu.
O que aquela garota fazia naquele lugar perigoso? Por que ela era tão cala e sozinha? E por que era tão misteriosa?
No dia seguinte decidimos segui-la. Queríamos saber de uma vez qual o segredo da garota. Então, quando a vimos, diminuímos nossos passos para ela nos passar. Vimos que no início ela também diminuiu, mas logo continuou seu caminho normalmente. Entrou no beco e fomos atrás dela.
Aquele lugar era escuro e fedido. As paredes descascando, insetos andando de um lado para o outro. Tinha um outro cara sentado do lado de um cachorro, ele ficou nos observando suspeitamente. Num canto mais escuro começamos a ouvir choros. Paramos e logo quando olhamos, vimos que era a nossa garota misteriosa. Ela nos viu, mas não parou de chorar.
- O que vocês querem? Me seguiram até aqui? Para que?
Não dissemos nada, apenas ficamos a encarando, confusos.
- Por que não vão para a escola e me deixam?
Sentei ao seu lado e fique olhando para o meu amigo em pé a minha frente. Ele também sentou. Ficamos sentados e calados pensando em alguma coisa que faria sentido.
- Eu era da escola de vocês. Saí de lá no meio do ano. Não lembro de vocês por lá...
- Mudamos recentemente. Onde estuda agora?
- Estudar? Quem? Eu?! – Ela deu uma gargalhada irônica. – Não estudo mais, a escola só me trazia... problemas.
Pausamos para analisar a tal frase.
- Eu... não era aceita. Eu gostava de falar com todos, mas eles não gostavam de falar comigo. Virei piada da escola. Conheciam-me como bobo da corte. Péssimas lembranças, mas infelizmente não há como tirá-las de mim. ninguém sabe a dor quando não é com você mesmo, não é mesmo? Não adianta ficar falando aqui que zoar as pessoas é ruim se eu nunca fui zoada. Realmente dói. E sei que o que fiz também não foi certo, mas não volta mais naquela escola.
Parecia que estava refletindo a vida. Achamos que esquecera que estávamos ali. Foi falando e falando sem se preocupar com a platéia.
Ela nos contou um pouco da história. Ela era uma garota muito feliz, mas achavam que ela tinha problemas. Uma pessoa muito boa, então a fizeram de boba. Usaram-na para fazer trabalhos, deveres só por ela ser uma pessoa prestativa. Mas então ela começou a perceber qual era o verdadeiro valor dela naquele lugar e se revoltou, foi aí que as pessoas começaram com as piadas e as ofensas. Então ela saiu da escola escondido. Não queria mais ver aqueles garotos que riram dela até ela chorar e sair correndo pelo corredor e se esconder todos os dias em um beco escuro onde pudesse estar só e chorar um pouco.
Ingrid Raina